MAPUTO, Meu nome é Amélia Matsinhe e tenho 30 anos. Tenho dois filhos, um menino de 13 e uma menina de sete. Meu marido morreu em 2005. Ele nunca fez o teste mas eu sei que ele tinha SIDA. Só podia ser SIDA, porque ele ficou doente por muito tempo. Eu fiz o teste em 2006. Eu estava doente, muito magra, mas tinha medo de fazer o teste, porque sabia que ia vir positivo. Eu pensava que a SIDA era uma doenca de prostitutas e eu não era prostituta. Ele foi meu único parceiro. Mas uma amiga que tambem é seropositiva viu os sinais e insistiu para eu fazer o teste. Tive que comecar a tomar os antiretrovirais logo depois que descobri que era seropositiva. Na primeira semana tive que ficar na casa dessa amiga. Ela cuidou de mim porque eu estava muito fraca, os comprimidos eram muito fortes e eu não tenho família em Maputo. Com o tratamento, meu corpo começou a reagir. Hoje eu tomo dois comprimidos, um às 7 horas e outro às 19 horas. As crianças sabem que eu sou seropositiva e me lembram de tomar o medicamento. Minha saúde é boa, mas eu sofro muita discriminação onde moro. As mulheres do meu bairro dizem que eu vou morrer logo. Elas não falam na minha frente, mas eu consigo escutar da minha casa. Há dois meses, fecharam a entrada da minha casa com um muro porque eu sou seropositiva e não tenho ninguém para me defender. Agora eu tenho que entrar pela casa do vizinho, por uma passagem provisória. Eu já reclamei, mas as pessoas dizem: “Ela vai morrer logo, para que precisa de passagem?” Um dia o responsável pela vizinhança passou na minha casa porque tinha ouvido que eu tinha SIDA. Ele perguntou se eu me cuidava, se eu trazia homens aqui, se eu usava preservativo. Ele tem medo que eu esteja passando o virus por aí. Eu sei como é difícil a vida de um seropositivo, eu nunca faria isso. Lógico que eu me cuido. Se hoje eu estou saudável é porque me cuido, mas eu não tenho namorado, nem quero ter. Tenho medo, não consigo mais confiar. Quando fiquei sabendo que era seropositiva, chorei por uma semana, não comia. Mas depois eu aceitei porque eu sofri, vi meu marido morrer, mas quero viver para ver meus filhos crescerem. A vida não é fácil. Eu não tenho trabalho e tem dias que não tenho dinheiro para comer. Mas agora eu ajudo outras pessoas, falo para fazerem o teste quando eu vejo os sinais. Hoje eu não tenho mais medo da SIDA.
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9 comentários:
paulo
Realmente africa esta uma miseria
em relação ao hiv.
mas deixa estar que cá, tambem existe muitos casos iguais a este.
não devia mas existe, como ja contei uma vez ,tive um amigo que enquanto não descobriram o que ele tinha,teve quarto e trabalho, quando veio do hospital e ficaram a saber, foi corrido do quarto (ele pagava a renda sempre) e o trabalho foi-se, ja não havia trabalho para ninguem.
e como ele queria trabalhar coitado
ninguem lhe deu a mão, ainda lhe tiravam o pouco que tinha.
acabou por morrer.
beijocas
Não tenho palavras para a Dª. Amélia Matsinhe apenas elogiar a SUA GRANDE CORAGEM para ir vivendo e enfrentar a discriminação pura, desleal, terrível e BESTA praticada pelos seus conterrâneos.
São poucos os países de África quem têm uma campanha/medicação/acompanhamento eficaz. Sei apenas da realidade angolana onde já há muito se começou a trabalhar, a prevenir/ensinando, e na aplicação dos tratamentos.
Por cá ainda existe o preconceito, a ignorância versus discriminação...mas se olharmos para África vemos que já avançámos muito.
Um beijo e um abração a ti Paulo por me teres dado a conhecer este testemunho de uma realidade tão cruel.
Salve!
Apenas me resta o silêncio lacrimoso, pela infelicidade, abnegação e coragem dessa minha irmã conterrânea.
Ainda há um longo caminho a percorrer para derrotar essa monstruosa barreira de preconceitos e maliciosas mentiras, que pairam sobre o VIH/SIDA.
Muitas Amélias lutam e tentam sobreviver em África. Que as nossas preces estejam com todas elas. E se as quisermos ajudar mais materialmente, pois então lutemos para eliminar também os preconceitos, medos e fantasmas que ainda envolvem o VJH/SIDA nas nossas sociedades, ditas mais evoluídas.
Salutas!
GOSTAVA DE TER ESTA FORÇA.
Sideny
Sim, já tiveste oportunidade de me contar pessoalmente a evolução do VIH no teu amigo, pela resposta que teve da sociedade, e por teres sido tu, a única, que se prontificou a ajudá-lo, a acompanhá-lo, a ir ao hospital buscar-lhe os medicamentos.
Porque és assim e porque mais do que qualquer pessoa, em que a maioria é solidária somente da boca para fora, tu sabes o que significa a infecção pelo VIH, porque sentes na pele nove anos de infecção.
Gosto mesmo muito de ti.
Beijoka Gôda.
Fatyly
Sim, é um facto que progredimos imenso face à realidade do continente africano.
No entanto e passados tantos anos desde o surgimento desta pandemia, o mundo inteiro deveria já entendê-la como outra pandemia qualquer, o que efectivamente não acontece.
Deixo-te um beijo e o desejo de um bom Domingo.
ManDrag
Para ti, querido amigo, não tenho muito mais a dizer, pois sinto-te tal qual és, de dentro para fora.
Deixo-te um abraço e o desejo de um bom Domingo.
Joka
Para tudo é preciso um tempo e o teu tempo virá também, para superares a recente notícia da infecção.
Abraço
Paulo
Já tinha lido este post que me chocou de sobremaneira. Aquele muro, aquela discriminação directa e cruel... A coragem desta mulher linda, a força que imprime na sua conduta.... Paulo vale a pena lutar, temos que lutar para que não haja muros destes a separar pessoas.
Abraço
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