Parece-me por vezes que a vida está numa encruzilhada sem saída e com diversos caminhos, que tornam a decisão de escolha sobre qual seguir uma missão ciclópica.
Não há caminhos fáceis e todos eles estão ensombrados com a perspectiva de uma estrada sem saída. É um círculo de fogo à minha volta, em que parece não haver outra saída, a não ser aquela que o escorpião toma numa situação como esta.
A noção de pecado ou de culpa que se quer expiada afinal onde está? Qual o preço a pagar por um crime cometido, se ao amor ou a um caldo de droga injectável se pode chamar de crime. E aqueles em que a condenação vem de actos praticados pelos seus progenitores.
Aceitar a infecção pelo HIV é fácil depois de se compreender que isso não nos vai matar de imediato e que podemos ter uma vida com alguma qualidade. Viver durante anos e anos a infecção e ver o nosso corpo a degradar-se cada vez mais devido aos medicamentos tomados para controlar a infecção é que se torna insuportável.
No passado, mesmo quando a visita às urgências era obrigatória duas vezes por semana com dores horríveis devido a problemas renais isso era encarado com optimismo. Medicação mudada problema resolvido. A Vida segue em frente alegremente pois volta tudo ao normal.
Depois vêm os problemas com o fígado devido ao novo medicamento. Uma Ascite, um internamento hospitalar por cerca de 15 dias e um lóbulo do fígado com cirrose. Tiram-se uns litros de um líquido esverdeado da região abdominal e nova mudança de medicamento.
Parecia tudo correr na perfeição, depois de se escolher um medicamento menos tóxico o que durou perto de 4 anos. Um telefonema do hospital, num horário já tardio de uma noite, pedia para interromper de imediato a toma desse medicamento pois havia sido detectada uma anomalia no seu fabrico e o medicamento poderia estar contaminado com uma substância altamente cancerígena e potencialmente mortal.
Nova mudança de medicamentos e desta vez para mal dos meus pecados ao fim de pouco mais de um ano de os estar a tomar começam a aparecer estes problemas cardíacos.
Não é dos medicamentos que estou a tomar embora pudessem acelerar o processo, dizem os médicos. Afinal e depois de muito pensar sou levado a concluir que não morrerei da doença mas da cura ou dos medicamentos tomados para uma cura que o não é, e que servem apenas para atrasar o desenvolvimento da doença.
Posso até compreender o HIV, e os efeitos benéficos que o mesmo operou em mim para ter tempo para compreender e ajudar o meu semelhante. Posso encorajar aqueles que se encontram na mesma situação clínica do que eu e dizer-lhes que a vida não acaba ali e que a Sida pode ser o principio de nova vida.
Agora não posso aceitar nem compreender, que depois de tantos anos de investigação, ainda se tenham de utilizar medicamentos que a pouco e pouco nos tornam em farrapos humanos com as mais diversas patologias e que nos levam à morte ou à incapacidade total para controlarem a infecção.
Que crime afinal cometi, para uma condenação perpétua por agravo, que me obrigue e a tantos milhares de outros infectados a viver vidas que se degradam a cada dia que passa?
E agradecemos ter nascido numa parte do mundo onde há tratamentos que nos prolongam a vida e fazemos minutos de silêncio em memória daqueles que já partiram por não ter tido acesso aos retro virais. Quero viver como qualquer outro ser humano, mas por vezes questiono-me se o preço a pagar vale a pena e se não seria melhor desistir de tomar todo este arsenal químico de combate ao vírus maldito. A opção e a escolha é minha dir-me-ão e eu não poderei deixar de concordar com vocês. Afinal sou culpado ou inocente e de quê?
Perdoem-me este grito de revolta, mas ele saiu numa altura em que uma convalescença demasiado longa teima em não terminar e acerca da qual todos me dizem que é normal.
Não há caminhos fáceis e todos eles estão ensombrados com a perspectiva de uma estrada sem saída. É um círculo de fogo à minha volta, em que parece não haver outra saída, a não ser aquela que o escorpião toma numa situação como esta.
A noção de pecado ou de culpa que se quer expiada afinal onde está? Qual o preço a pagar por um crime cometido, se ao amor ou a um caldo de droga injectável se pode chamar de crime. E aqueles em que a condenação vem de actos praticados pelos seus progenitores.
Aceitar a infecção pelo HIV é fácil depois de se compreender que isso não nos vai matar de imediato e que podemos ter uma vida com alguma qualidade. Viver durante anos e anos a infecção e ver o nosso corpo a degradar-se cada vez mais devido aos medicamentos tomados para controlar a infecção é que se torna insuportável.
No passado, mesmo quando a visita às urgências era obrigatória duas vezes por semana com dores horríveis devido a problemas renais isso era encarado com optimismo. Medicação mudada problema resolvido. A Vida segue em frente alegremente pois volta tudo ao normal.
Depois vêm os problemas com o fígado devido ao novo medicamento. Uma Ascite, um internamento hospitalar por cerca de 15 dias e um lóbulo do fígado com cirrose. Tiram-se uns litros de um líquido esverdeado da região abdominal e nova mudança de medicamento.
Parecia tudo correr na perfeição, depois de se escolher um medicamento menos tóxico o que durou perto de 4 anos. Um telefonema do hospital, num horário já tardio de uma noite, pedia para interromper de imediato a toma desse medicamento pois havia sido detectada uma anomalia no seu fabrico e o medicamento poderia estar contaminado com uma substância altamente cancerígena e potencialmente mortal.
Nova mudança de medicamentos e desta vez para mal dos meus pecados ao fim de pouco mais de um ano de os estar a tomar começam a aparecer estes problemas cardíacos.
Não é dos medicamentos que estou a tomar embora pudessem acelerar o processo, dizem os médicos. Afinal e depois de muito pensar sou levado a concluir que não morrerei da doença mas da cura ou dos medicamentos tomados para uma cura que o não é, e que servem apenas para atrasar o desenvolvimento da doença.
Posso até compreender o HIV, e os efeitos benéficos que o mesmo operou em mim para ter tempo para compreender e ajudar o meu semelhante. Posso encorajar aqueles que se encontram na mesma situação clínica do que eu e dizer-lhes que a vida não acaba ali e que a Sida pode ser o principio de nova vida.
Agora não posso aceitar nem compreender, que depois de tantos anos de investigação, ainda se tenham de utilizar medicamentos que a pouco e pouco nos tornam em farrapos humanos com as mais diversas patologias e que nos levam à morte ou à incapacidade total para controlarem a infecção.
Que crime afinal cometi, para uma condenação perpétua por agravo, que me obrigue e a tantos milhares de outros infectados a viver vidas que se degradam a cada dia que passa?
E agradecemos ter nascido numa parte do mundo onde há tratamentos que nos prolongam a vida e fazemos minutos de silêncio em memória daqueles que já partiram por não ter tido acesso aos retro virais. Quero viver como qualquer outro ser humano, mas por vezes questiono-me se o preço a pagar vale a pena e se não seria melhor desistir de tomar todo este arsenal químico de combate ao vírus maldito. A opção e a escolha é minha dir-me-ão e eu não poderei deixar de concordar com vocês. Afinal sou culpado ou inocente e de quê?
Perdoem-me este grito de revolta, mas ele saiu numa altura em que uma convalescença demasiado longa teima em não terminar e acerca da qual todos me dizem que é normal.
12 comentários:
Raul
Eu entendo o grito. Um grito inconformado. O grito da revolta mas também o grito de vida. E é com esse grito de vida que irás continuar e irás vencer.
O percurso não se faz questionando o passado mas convertendo as experiências em bagagem útil. Se alguém bate à tua porta perguntas quem é e não quem foi.
Relativamente aos medicamentos e aos seus efeitos secundários que sabemos nós? Como diz o ditado popular por vezes Deus escreve direito por linhas tortas.
Tenho um texto para publicar no Sidadania (o Paulo passou-me a perna publicando hoje)sobre um primeiro caso de cura total dum individuo com SIDA.
Que mais te posso dizer a não ser isto: força Raúl, dá mais um passo e depois outro e outro. Nós te acompanharemos. As tuas vitórias serão as nossas vitórias. Porque enquanto houver pessoas como tu, com essa coragem para enfrentar as dificuldades, nós podemos dizer com toda a convicção: Yes, we can.
Abraço
Muito original...voltarei
http://www.arte-e-ponto.blogspot.com
Olá Lidia
Esse texto vai ser muito bom. Acho que é o texto do transplante de medula e da cura inesperada. Enviei-te o acesso a todos os blogs para poderes mais livremente publicar.
A coragem por vezes é mais uma máscara do que uma realidade perante factos que nos diminuem a capacidade de lutar a forças residuais. No entanto seguiremos o rumo com pequenos desvios na procura de melhores ventos. Abraço
Carla Silva e a cunha tá metida para visitarem o teu blog.
Bem vinda ao nosso sitio e iremos dar uma olhadela ao teu cantinho também. Ofereces um cházinho?
Raul
Olá!
Claro que ninguém é absolutamente corajoso mas admitir o medo é já uma forma de coragem. Manter o espírito activo e vigilante, ser irónico e solidário que mais não são que formas de coragem em quantidades e redutos desconhecidos?
Bom, mas deixemo-nos de filosofar e vamos ao caso concreto do indivíduo que se curou da Sida através dum transplante de medula. É algo que não estava previsto pelos cientistas e que merece uma franca reflexão.
Não, eu não tenho acesso a todos os blogues da holding Sidadania. Mas também não quero ter porque não acho importante que tenha. A M. e o Paulo garantem, a ém de ti a qualidade e quantidade necessárias. Agora um texto com informação substantiva sobre o HIV deverá, em meu entender, ser sempre publicado no Sidadania I.
Beijos
Lidia
O convite foi feito e está pendente.
Há sempre um lugar e um texto para colocar em cada blog,e é bom teres acesso a todos.
Beijos
Raul
Pois claro que é normal ! :)
Tens de fingir que tens paciência e aguardar sempre pelo dia seguinte, na esperança de te sentires melhor.
Preocupam-me também os efeitos secundários dos medicamentos, agora que caminho a passos rápidos para dois anos de medicação.
Mas, poder estar aqui a ler e a escrever-te é o prémio que tenho pelo controlo temporário do VIH sobre o organismo, e o resto são cantigas...
Dos males o menor... e o resto, que seja o que Deus quiser...
Sinceras melhoras.
Abraço
raul
Pois é t~ens mesmo de arranjar calma, para ficares bom da tua cirugia,so o tempo te vai curar.
no natal ja estas bom vais ver.
quanto ao hiv nós ja sabemos que não vamos morrer dele como a cura e a vacina tardam para em chegar para nós.
vamos aguentando com os efeitos secundarios dos medicamentos , que vão dando cabo de nós.
e ai sim la vamos nós desta para melhor.mesmo noutras doenças tambem ha medicamentos com efeitos secundarios graves.
beijocas
Raul
Anda cá rapaz, aninha-te nos meus braços (com todo o respeito que me mereces) e dou-te o maior abraço e carinho...pronto já te sentes melhorzinho?
Fazes bem em gritar cá para fora o que atormenta a alma e de facto nesses momentos não há palavras de ânimo que nos fazem levantar. Tem calma pá, vá lá queres um cafuné? prontosss (como dizem os mais novos) isso vai atenuar porque são momentos terríveis de vacilação e medo, comum a quem padece do quer que seja.
Se se trata da cabeça, entope a canalização.
Se se trata de uma virose, o fígado fica abalado e a dizer que não quer mais.
Se se trata do fígado refila o estômago.
E o estômago danado e farto de tantos "berlindes" diz à cabeça: oh minha amiga diz a esse gajo(a) que tenha calma e paciência, sim amiga eu sei que é fácil falar, mas tens que ter força e dizer-lhe porque se o não fizeres, todos nós "orgãos" sentimos.
Sabes "cabeça" quando não se chora e grita devido à ansiedade e ou depressão eu e os meus companheiros como os rins, a bexiga, o berimbau, etc. choram e gritam.
Prometido:)
......................
Agora sou eu a falar:
Desconhecia essa cura através do transplante de medula e ainda não li nada, mas aguardarei a vossa publicação.
Não é fácil meu amigo esse combate, mas irás vencer e ainda terás a sorte de veres e sentires a "irradicação do virús".
Um beijo do tamanho do mundo para ti, para os teus e para todos que comentam ou não.
Bom domingo!
Raul querido...
Seu grito(seu desabafo)acontece porque és humano.Você é forte,você tem sobrevivido e tentado manter o pensamento positivo e com isso ajudado tantas pessoas.Mas é humano.Então, é normal que grite,que chore e q as vezes se deprima ou se canse.Mas vc também é obstinado e só por isso, sei q no minuto seguinte após este desabafo você já está de pé novamente...Entendo você...Imagino q diante de certas provações pensamos(mas porque comigo?).Quem sabe um dia amigo, esta doença seja lembrada como a tuberculose ficou no passado.Sonho com o dia em que acodarei e lerei nos jornais que a cura ou enfim uma vacina para o HIV foi descoberta e um grande cientista ganhará o prêmio Nobel e muitas pessoas se salvarão.Lembre-se q há exatos dez anos pessoas com o HIV não chegavam nem a metade da sobrevida q vocês hoje têem.E isso amigo,já é sim uma grande vitória.Penso no Cazuza(u cara q viveu a frente de seu tempo) e em tantos mais q se foram assim, sem ter tido tempo de esperar...Beijinhos ternos.
Da amiga
Maria Dias
"É um círculo de fogo à minha volta, em que parece não haver outra saída, a não ser aquela que o escorpião toma numa situação como esta."
As lendas dizem que se suicida. já te li três vezes e das três vezes contei até cem para não explodir, ir aí dar-te um enxerto de porrada. Mas como ainda estás todo partido vou deixar para depois, mais uns mesitos antes de te ir partir os ossos todos e atear outro circulo de fogo à tua volta a ver se ainda pensas escorpião. Podemos falar do que sentimos até certo ponto,gritar de revoltar ou achar-nos culpados de crimes que não existem. Mas ir ao ponto de falar sobre algo que não é uma atitude que não faz parte da nossa essência pensando que talvez dê um ar de protagonismo à história pode ter impacto negativo em quem pouco te conhece. E do que te conheço Raul, perdoa insistir mas és a última pessoa que eu vejo a levar a cabo uma atitude drástica. Por isso parto do princípio que disseste aquilo como metáfora para ilustrar a angústia por que andas a passar mas peço-te que, apesar de teres de passar inevitavelmente por ela, não a carregues de culpa. Nem tu nem metade da humanidade de sofre cometeram qualquer crime nem são merecedores do castigo de que se acham portadores. São produto do acaso. Uns em nada contribuiram, outros cometeram erros e pagaram por isso.Mas todos zsem excepção são fruto de um jogo aleatório do universo, e as probabilidades sãs as mesmas que em qualquer hoje: todos se atravessam, uns saem ilesos e com sorte. outros azarados e perdedores. Depois só têm, por muito que doa,saber sair da perda e recuperar ao máximo o que lhes foi despojado. Claro que é normal. É normal o teu grito. É normal o seu eco. Recupera o teu espaço porque há uma comunidade importante que precisa de ti e da esperança que por vezes transmitias para sentir que não é o fim se não o deixarmos. Lembra-te de um que se tornou tão importante. E lembra-te de outros como ele que possam estar a ler-te e que de certo modo poderão achar que se for para passar por isto não valerá a pena lutar.
Abraço-te muito.
Amigo, assim como o desabafo uma vez escrito aqui pelo Paulo, ou algum desabafo escrito pela Lidia ou por mim ou por muitos outros, fico contente por esses gritos que deste, pois ao se questionar sobre a vida , sobre esta luta que tens de passar hoje e ao mesmo tempo lembrares de que apesar de tudo, essa situação te transformou em uma pessoa melhor, já faz tudo valer a pena, quanto ao sofrimento? talvez haja muito mais sofrimento em corações de pedra como alguns que conhecemos do que em uma pessoa como você, és forte, tens demonstrado isso por toda uma vida e espero que continue a demonstrar toda a força e a vida que há em ti, mesmo que as vezes demontre momentos de fraquezas, espero melhoras e desculpe-me pelo sumiço.
Abraço pra ti, pro Paulo, Lídia e restante do pessoal.
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